Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
Enquanto estavam com o Senhor os discípulos presenciavam a inauguração da maior novidade da história. Pressentiam em seus corações que a presença de Jesus era o acontecimento do Reino. O espaço do em torno era preenchido por sua presença, de modo que nenhuma ausência havia ali.
Na profissão existencial de fé quando Jesus perguntou aos doze se eles também não queriam ir embora, Pedro respondeu: “a quem iremos Senhor?” (Jo 6,68).
Não era humildade, era testemunho de um fato que identificava Jesus com o Reino. A confissão da impossibilidade de ir para outro lugar, atestava que fora dEle jazia apenas escuridão e frio.
A questão sobre o Reino veio somente a após a Ascenção de Jesus. O seu lugar não pode ser preenchido, por mais que os apóstolos se esforçassem. Então começaram a se perguntar quando o Reino viria.
Essa é uma pergunta que vem de fora, mas não do coração mesmo dos discípulos. Eles testemunharam a presença do Senhor e se sentiram confortados por Ele.
Três acontecimentos ainda repercutiam em suas memórias. Três momentos nos quais a história do velho mundo foi ressignificada e o mundo novo surgiu.
No primeiro deles, Jesus corrigiu a velha história ao anunciar: “Ouvistes o que foi dito…eu porem eu vos digo…” (5, 21ss). Esse bramo marca a ruptura irreconciliável entre o que foi e que está por vir. A superação de todo pensamento arcaico traz a semente do que é realmente novo. Novo e estarrecedor! Pois subverte, por fim, a própria natureza humana. Educando-a e elevando-a à sublime condição de perdoar até mesmo os próprios inimigos.
No dito, lestes o que estava escrito pelos antigos, mas eu vos digo, Jesus, alerta que o velho já não vale mais. Um mundo mais exigente do que qualquer outra coisa surge, pois fará a humanidade galgar para fora de sua natureza, até alcançar as infinitas alturas, onde habita o próprio Deus.
Noutra ocasião, Jesus ressignifica a soma de tudo o que é santo no mundo antigo, o dia de sábado. Após superar o formalismo da lei para matar a fome aos que fome tinham, Jesus recorda que nenhuma lei é superior à misericórdia. O filho do Homem é Senhor também do sábado, e aqueles que duvidam é porque ainda não chegaram a entender o “que significa misericórdia em vez de sacrifício” (Mt 12,7).
Por fim, no último momento e gritos do velho mundo, o novo se sobrepõe com o chamado dos Doze.
À pergunta, sempre desconcertante de onde pormos as nossas esperanças, Jesus responde com uma fé inabalável na humanidade. Fé já demonstrada quando escolheu ser um de nós! Fé que demole a antiga concepção religiosa de salvação circunscrita nos rígidos limites das tribos territoriais, que sequestrava a salvação à fortuna do nascimento e à herança de coisas superadas.
É em nós, humanos, que reside a esperança! Por isso “chamando doze discípulos, Jesus deu-lhes poder para expulsar os espíritos impuros, curar todo tipo de doença e de enfermidade”, depois recomendou-lhes: “de graça recebestes, de graça deveis dar” (Mt 10).
Juntos, esses três princípios atestam, portanto, que o Reino de Deus já começou. Ele está germinando desde aqueles dias e cresce sem parar. A pergunta, então, não é mais quando virá o Reino de Deus, mas, sim, quando ele se realizará para todos nós?