Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
Quem é, pois, o meu próximo? Esta pergunta desconcertante aparece no diálogo de Jesus com um mestre da lei (Mt 10,29).
Ao repetir de maneira impensada o segundo maior de todos os mandamentos, em certo sentido, igual ao primeiro, amar ao seu irmão como a si mesmo, materializa-se a profissão fé de um crente que já não a punha em prática há bastante tempo.
Um dilema instaurado no coração da fé de quem conhece os princípios, mas nunca tentou praticar. Este é o dilema daquele tempo, e de hoje também.
Assim, é possível se perder em discussões infrutíferas que se estende pela eternidade. De preferência sobre questões que estão fora do meu poder legislar, muito embora se possa, de fato, praticá-las.
Os mandamentos repetidos até o cansaço se desgastam nas derrotas jurídicas, quando muito bem poderiam ser socorridos pelo comprometimento prático. Mas há uma questão que também é uma dificuldade, o comprometimento prático pode doer no bolso, exigir gastos e tempo. Por isso, aquele mestre da lei surpreendeu a todos nós com sua pergunta ingênua: quem é o meu próximo?
Ele já sabia quem era, mas passou a vida discutindo apenas a essência da lei. Achava que já amava a Deus o suficiente, por isso, nem se preocupou com Ele. Razão pela qual tenta se justificar apelando para a obscuridade daquilo que obscuro não era.
Jesus, o verdadeiro Mestre da Lei lhe explica didaticamente com a belíssima parábola do bom Samaritano, que aproxima dois grupos antagônicos e combativos desde tempos imemoriáveis.
Embora a pergunta seja sobre quem é o próximo para o homem caído pensarei agora ao homem de pé!
O Samaritano é o homem que escolhe. Professa sua fé com poucas palavras e muitas ações. Ele sabe que diante da dificuldade e do sofrimento do outro não pode persistir feridas não fechadas. Todos estão unidos pelo mesmo vínculo vital que forja a humanidade, e perdê-lo sem luta é um pecado clamoroso.
Para mantê-lo vivo não poupou o seu dinheiro. Gastou muito para garantir a vida àquele irmão! Socorreu-lhe no presente e no futuro, abrindo mão de parte de seus bens.
A reverência à lei não o tornou bom! A sua obediência retórica não o santificou! A sua coragem de agir e se desprender do que possuía foi o que lhe garantiu um lugar na eternidade, razão pela qual nos lembramos dele até hoje. Essa é a lição profunda que Jesus dá àquele mestre e a nós, indicando a ineficácia da fé de cruzados de batalhas vazias, que lutam com nuvens na forma abstrata da lei, pois como já nos lembrou são João: quem diz que ama a Deus que não vê, mas não ama o seu irmão que vê mentiroso (1Jo 4,20).
Portanto, me vem à tona neste momento, a breve reflexão de São João Crisóstomo quando exclama: “o que fizemos com a mensagem de Cristo? De que maneira a multidão dos pobres, dos excluídos, dos marginalizados, dos sem-casa, dos sem terra, dos sem-nada, pode acreditar que o Criador é Pai, que nos ama, se nós, que nos dizemos cristãos, que temos mais, continuamos a deixar o prato deles vazio… não sejamos apenas crentes… sejamos credíveis”.